Neste momento é
incontestável que a biodiversidade assume grande importância e entrou na Agenda
Política Internacional, Nacional e Local.
A Convenção da Diversidade
Biológica é um instrumento político-legal de âmbito internacional sobre a
gestão da biodiversidade. Em 2010, em Nagoya, com base na Convenção sobre
Biodiversidade Biológica, elaborou-se o Plano Estratégico para a Biodiversidade
para o período 2011-2020, intitulado “Vivendo em Harmonia com a Natureza” o
qual pretende que até 2050 a biodiversidade seja “valorada, conservada,
restaurada e prudentemente utilizada, mantendo os serviços dos ecossistemas,
suportando um planeta saudável e fornecendo benefícios que são essenciais para
todos os seres humanos” e acrescenta “as Partes devem desenvolver mecanismos de
apoio à aplicação do Plano, disponibilizando recursos técnicos e financeiros tempestivos,
adequados, previsíveis e sustentáveis.”
Também de acordo com a
Agência Europeia do Ambiente “até há pouco tempo, os argumentos em favor da
conservação das espécies e dos habitats eram baseados antes de mais em questões
como a sua singularidade evolutiva, raridade ou ameaça de extinção. Hoje estes
argumentos também incluem a forma como a manutenção da biodiversidade beneficia
directamente as pessoas e contribui para o bem estar e a qualidade de vida.”
A União Europeia enquanto
organismo regional também tem contribuído para que a biodiversidade seja
considerada como um recurso com valor incalculável. Na Estratégia Europeia para
a Biodiversidade 2020, sob o tema “O Nosso Seguro de Vida, o Nosso Capital
Natural”, estabelece que “até 2050 a biodiversidade da União Europeia e os seus
serviços ecossistémicos que ela fornece – o seu capital natural – sejam
protegidos, valorados e adequadamente restaurados pelo valor intrínseco da
biodiversidade e pela contribuição essencial para o bem estar humano e a prosperidade
económica de forma a que sejam evitadas as mudanças catastróficas causadas pela
perda de biodiversidade.”
A importância da
biodiversidade urbana tem aumentado, a Convenção da Diversidade Biológica em
2010 adotou um Plano de Ação para a Biodiversidade relativo aos governos
subnacionais, cidades e outras autoridades locais. Este Plano propõe a adoção
do Índice de Singapura de Biodiversidade nas Cidades (City Biodiversity Index)
e reúne indicadores de 3 categorias: biodiversidade na cidade; serviços
ecossistémicos; governância. Este Índice foi testado em várias cidades como
Curitiba, Bruxelas, Londres ou Lisboa. A Medida Bd 2.1.1 pretende garantir a
existência de uma paisagem diversificada que suporte uma rede de corredores
naturais que permitam a extensibilidade de espécies autóctones nas áreas
urbanas.
A Comissão Europeia elaborou
a “Estratégia Temática sobre Ambiente Urbano”, assumindo a importância das
zonas urbanas, uma vez que 4 em cada 5 cidadãos da UE vivem nas zonas urbanas,
directamente dependentes do ambiente urbano existente. Esta estratégia pretende
contribuir para o aumento da qualidade de vida, com níveis de poluição que não
tenham efeitos nocivos na saúde e no ambiente, encorajando um desenvolvimento
urbano sustentável. No seu ponto 6.2. faz-se referencia à conceção urbana
sustentável com um adequado planeamento da utilização dos solos, de forma a
fortalecer os habitats naturais e procurando-se a promoção da biodiversidade
urbana e a sensibilização dos cidadãos urbanos.
A biodiversidade está em
todo o lado, e as cidades não são excepção. A maior parte da população mundial
vive nos centros urbanos e espera-se que, com a emergente situação dos países
em desenvolvimento, esta seja uma realidade cada vez mais ampliada. A
proliferação e vivência nas grandes cidades trouxe consigo o acentuar de novos
problemas, como é o caso do tráfego aéreo, rodoviário, indústria, ruído,
poluição, substituição de espaços verdes por equipamentos de apoio à população
e, habitação. A urbanização da paisagem fragmentou o ambiente natural e
consequentemente alterou a paisagem e os seus processos biológicos.
A expansão da urbanização
acarreta consigo perturbações dos ciclos hidrológicos e biológicos, perda de
habitat, concentração de poluentes e resíduos e o fenómeno de “ilhas de calor”.
Em termos de saúde vai interferir no aumento das doenças relacionadas com a
qualidade do ar e água, saneamento, stress e calor, mas também na propagação
imediata e disseminadora de doenças com causa viral ou epidémica.
O ambiente urbano condiciona
a biodiversidade, menos tolerante à agitação urbana, o ruído, o movimento,
falta de alimento e abrigo natural. Embora o espaço urbano seja um limitador
das espécies selvagens, existem espécies que ao longo do tempo empreenderam uma
adaptação ao meio. Daí os espaços verdes urbanos desempenharem um papel de
grande importância para estas espécies como suporte da biodiversidade, mas não
só, também são reguladores do clima local e de mitigação de doenças, protecção
contra cheias pela retenção de águas e formação de zonas de infiltração de
águas pluviais, na regeneração e purificação do ar, no sequestro do carbono,
importante gás implicado nas alterações climáticas. Mas também tem importância
na protecção do solo e redução do ruído.
Igualmente interfere na
qualidade de vida das populações, atuando muitas vezes de forma inspiracional,
educacional, espiritual ou simbólica, quer por criar condições para o recreio,
prática de desporto, quer por ser muitas vezes a única ligação que a população
em geral tem com o mundo natural.
Na primeira infância isso
pode significar a interiorização dos valores da natureza e o contato com a sua
essência, as mudanças ocorridas nas diferentes estações do ano, os múltiplos
cantos das aves, as cores e textura das plantas e flores.
Apesar dos inconvenientes
dos espaços urbanos, a verdade é que muitas espécies preferem viver nestas
áreas, como é o caso dos pombos, ratos ou pardais, as razões são muitas e
variadas. A nossa sociedade cria muitos resíduos e desperdícios o que dá a
estas espécies o lugar ideal para encontrar abundancia de alimentos, sem que na
sua maioria necessitem estar preocupados com predadores. A situação torna-se
tão agradável para os seres humanos que se tornam tolerantes à sua presença,
alimentando-os deliberadamente. Apesar de à primeira vista não serem visíveis,
a verdade é que as cidades têm uma grande abundancia de abrigos e nichos
ecológicos (casas abandonadas, varandas, telhados, jardins, hortas, bosques,
lagos ou fontes). É também nos centros urbanos que existem as melhores
condições climatéricas (ilhas de calor) com mais 1,5ºc acima das zonas não
urbanas.
A adaptabilidade é tal que
muitas espécies não sobreviveriam sem a presença humana, como é o caso dos
pardais domésticos – Passer domesticus.
Esta vivencia nas zonas
urbanas, tal como para o Homem acarreta alguns perigos fortemente relacionados
com a falta de qualidade do ambiente. Esperança de vida muito curta relacionada
com a agitação e circulação de veículos, apenas viabilizada pela elevada fertilidade
motivada pelo abundante alimento. Mortes provocadas pela poluição atmosférica,
excesso de ruído, falta de refúgios nas construções modernas que adotam linhas
mais sóbrias, escassez de vegetação e da sua continuidade e elevado nível de
stress.
Dependendo da qualidade e
quantidade dos habitats disponíveis, as cidades atraem mais ou menos
diversidade de animais. As aves são o grupo mais abundante e também o mais
visível, embora não seja apenas composto por pardais, pombos, gaivotas ou
andorinhas. As aves são também o grupo com maior capacidade de adaptação,
facilidade de deslocação e ocupação. Existe por isso uma verdadeira ornitologia
urbana.
Por vezes muitas outras
espécies passam despercebidas e só damos pela sua existência quando por
circunstâncias diversas, como foi o caso ocorrido comigo há cerca de 5 anos,
quando no trajeto para o meu emprego bem cedo, apercebi-me de uma cria de
coruja das torres na berma da Estrada Nacional 250/1, muito possivelmente o
primeiro vôo mal sucedido, entreguei-a aos guardas florestais do Parque Natural
Sintra Cascais que por sua vez a reencaminharam para o Centro de Recuperação de
Animais Silvestres de Lisboa, em Monsanto, mais tarde e em tempo foi libertada
nesta região com a assistência de escolas de Lisboa do 1º ciclo.
Embora a maioria da
população tenha uma especial simpatia por aves, existem outras espécies que
desempenham um papel preponderante na sociedade humana. Dirijo-me agora a
répteis, a cobra-de-ferradura, é uma serpente inofensiva para o ser humano e
grande devoradora de ratos e ratazanas que infestam os nossos meios urbanos. No
ano 2000 estimava-se que na área da grande Lisboa existiriam cerca de 4,5
milhões destes roedores, quase o dobro da população existente.
Também as osgas, muito pouco
apreciadas, desempenham um papel fundamental por devorarem centenas de
mosquitos, estes sim, possíveis portadores e transmissores de doenças para o
Homem e outros animais.
As lagartixas também estão
presentes, assim como sapos, rãs, salamandras e por vezes tritões, todos
grandes consumidores de insectos nocivos ao ser humano. Em áreas maiores, como
os jardins do Palácio de Queluz, também é possível visualizar cágados na
Ribeira do Jamor, que os atravessa.
Mamíferos como os
musaranhos, coelho bravo, toupeiras e ouriço-cacheiro são comuns em jardins e
parques amplos mas também nas hortas urbanas espalhadas pelo Concelho.
Infelizmente só damos pela sua presença quando sofrem um acidente,
principalmente rodoviário e no início da Primavera, altura em que os juvenis saem
de perto da progenitora e aventuram-se por novos caminhos. Os morcegos são
outros mamíferos que vivem mais perto de nós do que suspeitamos, não será por
acaso que em pleno Cacém há 2 anos encontrei um morcego ferido numa asa, desta
vez, depois de o isolar para o manter sem stress, liguei para o SEPNA que o
recolheram e entregaram em Monsanto. Estes animais embora não sejam muito
acarinhados desempenham um papel
ecológico de grande importância porque se alimentam exclusivamente de insectos,
aproximadamente o seu peso numa só noite!
A experiência de mesmo num
ambiente urbano estar em contato com a natureza é extraordinária, é preciso
apenas criar disponibilidade para isso!
Bibliografia consultada:
Gooders, John (1994), Guia
de Campo das Aves de Portugal e da Europa, Lisboa: Círculo dos Leitores;
Partidário, Rosário (2013),
Integração dos Serviços dos Ecossistemas na Avaliação de Impactos. Instituto
Superior Técnico de Lisboa, 28 de Março, 2014, disponível em:
Comissão Europeia, (2010),
Proteção da biodiversidade na União Europeia: Quais os próximos passos?,
IP/10/32, disponível em:
Moreira, Jaqueline C.C.,
Schwartz M., (2006), Educação e Sensibilização no espaço urbano: Turismo em
torno do jardim, Caderno Virtual de Turismo, Vol.6, nº 4: 37-48, disponível em:
Comissão Europeia (2006),
Estratégia Temática Sobre Ambiente Urbano, COM(2005)718final, Bruxelas,
Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu, disponível em:
Agência Europeia de
Ambiente, (2010), Ecosystem accounting and the costo f biodiversity losses. The case of Coastal Mediterranean Wetlands,
Copenhagen: pág. 5, disponível em:
Cristina, o seu 1º blog explora, não os conceitos de biodiversidade e do seu valor (como era pedido ;)) mas a biodiversidade em espaço urbano, algo que na última década, e em particular desde a 9ª COP, Nagoya 2010, tem ganho imenso interesse na comunidade científica ... e a pouco e pouco na comunidade urbana, de um modo geral. Afinal, é em espaço urbano que a maioria da humanidade já vive. É uma matéria que me é muito querida. Gostei. PBN
ResponderEliminarOlá Cristina,
ResponderEliminarGosto de tema, e gosto da forma como é abordado!
Entendo a biodiversidade urbana como resultante de iterações ambientais, biológicas e socioeconómicas. Contudo, a predominância de edificação/urbanização causa profundas alterações sobre o meio ambiente e, consequentemente, sobre a qualidade de vida dos seres vivos!
A urbanização modifica a estrutura física e biótica do habitat, podendo afetar os processos ecológicos que envolvem a fauna e a flora destas áreas. Em resultado da ação antrópica a paisagem fragmenta-se num mosaico de diferentes ambientes que culminam numa série de problemas socioambientais... Inadequações que vêm ultrapassando a capacidade de suporte e de absorção do meio ambiente.
Neste contexto, é internacionalmente reconhecida a importância da biodiversidade urbana. No entanto, “são tantas as agressões ao meio ambiente, como a poluição do ar, do solo e da água, e as suas consequências, que somente com a aplicação de sanções penais, como meio de prevenção, é que conseguiremos refreá-las”
Fonte:
http://www.slideshare.net/numispato/biodiversidade-em-ambiente-urbano-a-cidade-de-alccer-do-sal-28446081
Flora, 900942
Olá Cristina,
ResponderEliminarGostei bastante do tema. Por vezes esquecemo-nos que, mesmo nas zonas altamente urbanizadas, as em que circula diariamente uma grande quantidade de veículos, ainda existe bio-diversidade. Pensamos que esta existe apenas em zonas florestais em que a natureza é abundante, contudo de fato a urbanização e o desmatamento efetuado afeta em grande parte a biodiversidade e os ecossistemas existentes.
É interessante o fato de podermos verificar a evolução e extinção de biodiversidade através dos tempos como forma de adaptação ao ambiente que a rodeia. Esta evolução pode ser verificada através da análise dos fósseis existentes nestas zonas (Gray, 2014).